Ultraprocessados Impactam a Microbiota de Bebês Segundo Estudo

Impacto do Consumo de Alimentos Ultraprocessados na Microbiota Intestinal de Bebês: Estudo Brasileiro Revela Dados Importantes

Um estudo recente realizado no Brasil aponta que o consumo de alimentos ultraprocessados pode afetar adversamente a microbiota intestinal de bebês, especialmente aqueles que já passaram pelo processo de desmame. O desenvolvimento da microbiota intestinal durante os primeiros anos de vida é crucial, e a exposição precoce a fatores ambientais, como a dieta, desempenha um papel significativo neste processo.

A amamentação é amplamente reconhecida por seus benefícios na modulação da microbiota infantil. O leite materno não apenas apoia a regulação imunológica das crianças, mas também aumenta a resiliência ecológica da microbiota intestinal e oferece proteção contra doenças relacionadas à disbiose. Contudo, os efeitos do consumo de alimentos ultraprocessados (AUP) na microbiota de crianças saudáveis, especialmente em países de baixa e média renda, ainda não estavam completamente esclarecidos até agora.

Metodologia do Estudo

O estudo fez uso de dados coletados do Estudo de Saúde Materno-Infantil e Nutrição no Acre (Estudo MINA-Brasil), uma coorte de nascimentos que representa a população da Amazônia Ocidental Brasileira. No total, 728 crianças foram incluídas na pesquisa, e amostras fecais foram coletadas para extração de DNA e análise da microbiota intestinal.

Informações sobre amamentação e alimentação complementar foram registradas durante as visitas de acompanhamento aos 1 mês, 6 meses e 1 ano de idade. Na visita de 1 ano, foi aplicado um registro alimentar semiestruturado de 24 horas. Os alimentos considerados ultraprocessados, de acordo com a classificação NOVA, incluíram opções como iogurte saborizado, sucos artificiais, refrigerantes, achocolatados, balas, biscoitos recheados, salgadinhos de pacote, entre outros.

A população do estudo foi dividida em quatro grupos:

  • Amamentação e não consumo de AUP no primeiro ano (n = 56)
  • Amamentação com consumo de AUP no primeiro ano (n = 448)
  • Desmame e não consumo de AUP no primeiro ano (n = 36)
  • Desmame com consumo de AUP no primeiro ano (n = 188)

Resultados e Descobertas

Diversidade Microbiana

Os pesquisadores descobriram que bebês desmamados que consumiram alimentos ultraprocessados apresentaram uma diversidade alfa e beta da microbiota intestinal significativamente maior em comparação com aqueles que foram amamentados e não consumiram AUP. No entanto, é importante notar que esses efeitos observados na diversidade podem não ser exclusivamente atribuídos ao consumo de AUP, mas sim à prática da amamentação em si.

As crianças amamentadas que não consumiram AUP mostraram uma abundância relativa maior de Bifidobacterium, um gênero considerado um dos melhores indicadores da saúde da microbiota intestinal na infância. Em contrapartida, a abundância de Firmicutes, Blautia, Sellimonas e Finegoldia foi menor entre os bebês amamentados que não consumiram AUP em comparação com aqueles que foram desmamados e consumiram esses alimentos.

Alterações na Microbiota dos Bebês Desmamados

A microbiota dos bebês desmamados que consumiram AUP apresentou alterações notáveis. O filo Firmicutes mostrou uma maior abundância, que foi observada em ambos os grupos de crianças desmamadas, independentemente do consumo de AUP. Estudos anteriores sugerem que uma maior presença de Firmicutes pode estar relacionada à idade da microbiota intestinal, indicando que essas crianças podem ter uma composição de microbiota mais semelhante à dos adultos, apesar de sua tenra idade.

O gênero Blautia foi significativamente mais abundante entre as crianças desmamadas que consumiram AUP. Algumas evidências apontam que certas espécies de Blautia podem aumentar o risco de inflamação crônica, desregulação imunológica e distúrbios metabólicos, embora ainda faltem dados robustos que estabeleçam relações de causa e efeito.

Além disso, uma maior quantidade do gênero Sellimonas foi associada ao consumo de AUP, com possíveis efeitos prejudiciais, como o aumento do risco de obesidade infantil e problemas de saúde mental. O gênero Finegoldia também teve uma abundância elevada entre os bebês desmamados que consumiram AUP, sendo Finegoldia magna reconhecida como um patógeno oportunista associado a várias infecções em adultos.

Considerações Finais

Em síntese, os dados do estudo brasileiro indicam que o consumo de alimentos ultraprocessados pode ter um impacto negativo na diversidade e na abundância da microbiota intestinal de bebês, com efeitos mais pronunciados em crianças que já foram desmamadas. Estas descobertas ressaltam a importância da amamentação como um fator protetor e a necessidade urgente de políticas públicas e orientações nutricionais que desencorajem a introdução precoce de alimentos ultraprocessados na dieta infantil.

Referência: Faggiani, Lucas D. et al. “Effect of ultra-processed food consumption on the gut microbiota in the first year of life: Findings from the MINA–Brazil birth cohort study.” Clinical Nutrition, Volume 46, 181 – 190.


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